sexta-feira, 8 de abril de 2011

MANIFESTO PELO DIREITO DE ACREDITAR

Acredito na educação com a própria vida: sou professora. Antes de me tornar professora, fui estudante da escola pública brasileira. E para que a estudante de escola pública que eu era pudesse sonhar em se tornar uma universitária, tive de deixar minha cidade (Guarapari-ES) e minha mãe para ir morar com um pai que eu mal conhecia, mas que tinha o poder do capital. O poder do capital me inseriu num cursinho preparatório em que descobri o quanto eu não sabia e o que precisaria saber para ingressar na Universidade. Assim, pela via do exílio e da redenção “ao estranho que me forneceu o passaporte financeiro”, passei no vestibular, e me tornei uma universitária. Hoje, sou Mestre em Estudos Literários e Doutoranda em Letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. E sou professora.
Nos últimos seis anos, lecionei no cursinho gratuito “Projeto Universidade Para Todos”. Lá, vi sonhos de estudantes de escolas públicas (tão semelhantes à meninazinha exilada que aos 17 anos deixou seu mundo) se realizarem. Servi de degrau à conquista de alguns milhares de jovens pobres, e de seus genitores e progenitores que não tiveram as mesmas possibilidades e então se realizavam por tabela no sucesso dos filhos. Vi filhos de pedreiros virando engenheiros e filhas de domésticas virando psicólogas. Uso o impróprio verbo virar para metaforizar, mesmo, a virada nas condições e expectativas de vida dessa gente tanta, e tão forte, e tão resistente. Mas essa felicidade de pobre, mais essa (!) não passou impune. Mais uma vez, as pressões do capital ameaçam anular gente boa, destitui-la dos sonhos, dissuadi-la das ilusões. O Projeto Universidade Para Todos parece estar com os dias contados.
O cursinho, de perfil filantrópico, funciona movido a apoios, patrocínios, investimento de quem pode em quem quer e sabe fazer as coisas. Já contou com o suporte de Prefeituras – Guarapari e Serra, por exemplo –, de empresas particulares como a Arcelor, e, em sua época áurea – áurea por conta da dimensão e da quantidade de mundos particulares transformados – com a Secretaria de Estado da Educação, Sedu – época em que o PUPT chegou a atender mais de três mil alunos por vez! Acontece que, por motivos que o grande público desconhece, mas que devem ser enormes – para justificar a puxada de tantos tapetes de uma só vez...– a Sedu excluiu-se da parceria com o PUPT. Depois, por bandalheiras internas à política e aos desvios de verbas da turma e da família do “amigo do povo” Sérgio Vidigal, a Prefeitura de Serra também deixou de investir em “seu futuro”. Daí, seguiu-se uma procissão de debandadas. E o PUPT, sem apoio, não tem mais como funcionar.
Levantando acusações levianas sobre a legitimidade do apoio da SEDU ao PUPT, exigiram da Secretaria de Estado da Educação que abrisse concorrência pública para a escolha da escola que realizaria a preparação de alunos das escolas governamentais para o vestibular. Com isso, conseguiram fazer com que as atividades do cursinho que até então o fazia de maneira sistemática ficasse estacionado, e, por conseqüência, que os alunos da rede pública ficaram sem estudar até que uma decisão fosse tomada.
Mas, por quê, em nome de quê, abrir licitações para realizar um cursinho gratuito se esse cursinho já existia, e se isso atrasa o início das aulas, o início da busca? Talvez para atender aos interesses dos nove cursinhos particulares que se inscreveram para a chamada pública para licitação este ano. E sem se dar conta de que essas tantas escolas se ofereceram neste ano, mas quiçá retirem seu interesse assim que o Universidade Para Todos deixar de existir, e de ser uma ameaça à manutenção dos privilégios nas mãos em que sempre estiveram.
E quem garante que essas escolas oferecerão ensino igual aos alunos oriundos da rede pública, aqueles que num ontem recente esbravejaram – e ainda gritam, por meio das páginas dos jornais – seus argumentos mesquinhos contra as cotas e os benefícios aos alunos pobres? Ou será que de hora para outra passarão a tratar como iguais os estudantes pobres e os seus?
Sei lá, mas acho que o setor público está entregando nas mãos dos mais abastados a chance – e o dinheiro! – de que necessitavam para aniquilar de vez gente que, em suas egoístas concepções, nunca deveria ter saído das cozinhas ou das senzalas.
Esta comunicação tem por objetivo pedir uma doação a quem a receber. Não estamos pedindo dinheiro, coisa que não hesitaríamos em fazer se desse para remediar a situação. Mas não estamos. Eu, Luciana Ucelli, peço, por minha conta, que cada um que possa, doe o que tiver. Se tiver acesso, contatos, dedique alguns instantes para enviar mensagens a quem tem o poder de fazer algo: autoridades, órgãos públicos, empresas, instituições. Se tiver tempo, acesse no Orkut a comunidade “Ficapupt” (http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=1762625) ou participe da manifestação que acontecerá em 12 de abril, às 17h30, na Assembleia Legislativa do ES, pouco antes da audiência pública que arbitrará sobre o cursinho (às 18h.). Se tiver acesso à mídia, denuncie nossa perda. Se for da (a) mídia, tome parte disso como gesto de responsabilidade social. E, principalmente, se for um ex-aluno do PUPT, participe em nome dos próximos. Ou se conhecer um dos mais de 15 mil egressos, avise-o da audiência pública do dia 12 de abril (18 horas na ALES).
Mobilizações têm sido feitas sem muito sucesso. Professores e ex-professores têm se manifestado, com o apoio massivo de ex-alunos (hoje universitários) e de candidatos a futuros alunos da família PUPT (sem demagogia...), compondo o movimento “Fica pupt” que já conta com mais de 1.200 integrantes. Mas, como 1000 pessoas não elegem um governo, não bastam aos interesses políticos, precisamos engrossar as fileiras desse movimento, para nos fazer notar e atender.
Apesar do aborrecimento da academia para com a deformação de conceitos educacionais que um curso pré-universitário representa, há unanimidade quanto à necessidade de que esse tipo de curso continue a existir, dada a falta de suporte do Ensino Médio – principalmente o público – para enfrentar o meio de seleção que nos é possível: o vestibular. Tanto isso é real que os filhos de quem gere a universidade provavelmente passaram por esses meios para conseguirem estar lá.
É verdade que se trata de uma deformação do ensino, e que nesses cursos se transmitem conhecimentos de modo “instrumental”, em “pílulas”. Mas se o hiato entre o ensino que se fornece e a seleção que se impinge é um câncer, é mister que se empreenda uma terapia agressiva, cujos benefícios, ao fim, superam as seqüelas. E para tentar reduzir as diferenças de condições, é preciso que aqueles que têm o poder financeiro mas são limitados quanto aos meios de fazer a coisa certa invistam naqueles que sabem fazer a coisa certa, mas precisam de recursos. O vasto leque de provas desse saber fazer do PUPT pode ser visto diariamente transitando pela Universidade.
Ajude-nos a não deixar que esse trânsito se interrompa. Se não por uma igualdade, por uma redução das diferenças de condições de acesso à universidade. Se não pela cura das chagas educacionais brasileiras, que seja pelo paliativo que tem ajudado sonhos de jovens pobres a continuarem luzindo.
Saudações esperançosas
Professora Me. Luciana Fernandes Ucelli Ramos, estudante de escola pública e da Universidade pública, com orgulho.
Movimento Fica Pupt

P.S.: Por gentileza, e se possível, responda a esta mensagem.
Caso se interesse, acesse as imagens das últimas manifestações no endereço abaixo.

http://www.youtube.com/watch?v=8OY1VLuf4ps&feature=related